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Trazer as coisas à vida

Este trabalho foi realizado durante a disciplina de Projetos Avançados "Espaço, Tempo e Forma", orientada pela professora Dra. Tânia Bloomfield, do curso de Artes Visuais da Universidade Federal do Paraná. Durante aproximadamente um ano, de setembro de 2021 a maio de 2022, foram realizados trabalhos que se relacionaram ao ambiente da casa, referentes à proposta "Casa (Vi)vida: uma fenomenologia da casa como lugar geográfico", que foi dividida em três módulos: módulo 1 - “Eu, que moro aqui”; módulo 2 - “Espaço vivido”; e módulo 3 - “Tempo vivido”. O trabalho com/no espaço da casa aconteceu durante a pandemia de COVID-19, em que estivemos obrigados ao isolamento social e passamos a ficar muito mais tempo dentro da casa.

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Trazer as coisas à vida desenvolveu-se durante o módulo 1 "Eu, que moro aqui", no exercício "O corpo no corpo da casa". Nesta proposta de trabalho, a instrução dada pela professora Dra. Tânia Bloomfield foi: 

Para esse ensaio, pense no seu corpo como uma espécie de parte integrante da arquitetura da casa, como se fosse um órgão, um apêndice. Adeque-o, amolde-o, mimetize-o às paredes, às quinas, aos vãos, ao chão, às janelas, aos móveis, às passagens, num mesmo cômodo ou em cômodos diferentes. (BLOOMFIELD, 2021)

A partir da ideia de incorporar-me ao espaço, fazer parte da casa, desenvolvi três fotografias, em que partes do meu corpo passaram a apresentar uma posição horizontalizada em relação aos objetos da casa. Esta ideia de corpo como parte da casa, como uma espécie de órgão, relaciona-se ao conceito operatório coexistencializarem que assumo que é necessário perceber-se com os elementos circundantes e não perceber por meio de algo. Esse entendimento advém do contato com o antropólogo Tim Ingold que argumenta que precisamos nos misturar ao ambiente, ao invés de apenas percebê-lo como seres à parte dele. (INGOLD, 2015). O espaço não se constitui meramente por aquilo que nos rodeia, mas é resultado de relações:

O espaço, por esse entendimento, não é a matéria que resume as relações, muito menos a substância que condiciona a existência de um movimento, mas um resultado interativo, um chaveamento inscrito numa temporalidade marcante de um contato entre unidades da vida que estão em movimento. (INGOLD, 2015, p.64)

A perspectiva com pode assumir características de topofilia e/ou topofobia, em que o conceito de topofilia refere-se a relações de afinidade em espaços que geram boas sensações (TUAN, 1980), e o conceito de topofobia implica o oposto. Ao posicionar-me com o espaço, ambas relações podem coexistir. Além disso, o corpo incorporado na casa assume outra perspectiva sensorial, de maneira que percebo com a casa e não por meio dela. Esta é a ideia central das fotografias desenvolvidas, o que possibilitou-me trazer as coisas à vida. Coexistencializar.

Se eu fosse o filtro de barro da minha cozinha, prestaria atenção em como a água passa pela minha vela, tornando-se mais potável. Prestaria atenção em cada ser humano que viesse buscar um pouco de água, suas mãos, seus copos, seus corpos. Refletiria sobre a água que não habita os rios, mas me habita. Prestaria atenção na chuva, que cai no rio e vem parar dentro de mim. Prestaria atenção em meu corpo feito de barro, fresco e natural como o chão de terra. Prestaria atenção em como cada gota de água deixa de ser cheia de cloro para se tornar mais viva, mais água. Se eu fosse o filtro de barro da minha cozinha, com certeza, eu pensaria no porquê os humanos não me agradecem por filtrar a água que os mantém vivos.

Copo

Thallyta Piovezan, fotografia digital. 2021.

Se eu fosse o cabideiro do meu quarto, prestaria atenção em como cada roupa, cada bolsa pendura-se em mim, algumas mais pesadas, outras leves como o vento. Prestaria atenção em meu corpo feito de madeira: de onde eu venho? Refletiria sobre as madeiras que foram mortas para se transformarem em mim. Pensaria em como gostaria de não carregar a morte em mim. Prestaria atenção nas mãos dos humanos e como elas encostam em meu corpo de madeira, sem nunca me notarem.

Cabideiro

Thallyta Piovezan, fotografia digital. 2021.

Se eu fosse o travesseiro da minha cama, prestaria atenção na cabeça que repousa em mim todas as noites, no cabelo que encosta em meu corpo. Pensaria sobre como a cabeça, às vezes, repousa menos do que estou acostumado e em como fico largado na cama, apenas observando o teto. Prestaria atenção nas moscas voando, na luz na minha cara o dia todo. Refletiria de onde eu vim e como vou morrer. Descartado em um aterro sanitário? Será que vão me jogar lá pra morrer ou vão me matar antes? Eu teria outra possibilidade de existência, talvez fosse reciclado? Tenho medo dos humanos.

Travesseiro

Thallyta Piovezan, fotografia digital. 2021.

Outros trabalhos desenvolvidos:

Todas as fotografias das páginas abaixo são da autoria de Thallyta Piovezan, 2021-2022

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Módulo 1: Eu, que moro aqui - Retrato cego pessoal

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Módulo 1: Eu, que moro aqui - Retrato cego de Heloisa Panuci

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Módulo 1: Eu, que moro aqui - Literatura incorporada

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Módulo 2: Espaço vivido - 5 coleções de objetos

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Módulo 3: Tempo vivido - Os anos ensinam o que os dias não sabem

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